Divas para pessoas gordas viajarem

Turismo com acessibilidade: dicas para pessoas gordas viajarem

O período de viagens, frequentemente visto como uma oportunidade para descanso e lazer, pode se tornar um verdadeiro desafio para pessoas gordas devido a uma série de barreiras físicas e sociais impostas pela gordofobia.

A falta de espaço adequado, tanto nos meios de transporte quanto em hotéis, transforma a experiência de viajar em algo ainda mais desgastante e frustrante.

Em entrevista exclusiva ao Pop Plus, as jornalistas e criadoras de conteúdo Pollyane Marques e Sylvia Barreto falam sobre turismo com acessibilidade e oferecem dicas valiosas, além de evidenciar destinos que se destacam pela inclusão a corpos gordos.

Pollyane Marques, 39 anos, mineira que vive em Brasília há 20, é jornalista e ativista gorda. Criou o Viaja, Gorda!, em janeiro de 2019 com o objetivo de falar sobre acessibilidade em viagens. Seu foco principal é em mulheres gordas. No dia a dia, defende a acessibilidade como um direito fundamental, que começa muito antes da viagem.


Pollyane Marques é jornalista e ativista gorda criadora do perfil Viaja, Gorda!

A jornalista conta que criou o projeto com o propósito de contribuir para mudar a realidade das pessoas gordas. “Há seis anos surgiu o Viaja, Gorda!, fruto de um anseio pessoal, pois eu tinha dificuldade em encontrar conteúdos específicos sobre viagens que atendessem às necessidades do meu corpo. Então se não tem, a gente cria, né? Só gosto de lembrar que o Viaja, Gorda! é uma fonte de informação, mas as pessoas devem sempre pesquisar em várias fontes para encontrar os detalhes de cada destino. Isso porque seria humanamente impossível cobrir a enorme quantidade de locais e detalhes, e também porque é importante considerar diferentes pontos de vista.”


Sylvia Barreto é jornalista criadora do site e perfil Viajar é Simples.

 

Sylvia Barreto, 41 anos, é paulistana e há 15 anos compartilha seus desafios específicos como viajante gorda em seu site Viajar É Simples e redes sociais, como o Instagram. Ela trabalhou por um período como modelo plus size e ainda costuma incluir dicas de moda em seu conteúdo.

Sylvia conta que, inicialmente, os desafios de ser uma viajante gorda não faziam parte do seu trabalho no setor de turismo, mas surgiram à medida que ela enfrentava essas dificuldades.

“Há 14 anos, criei o Viajar é Simples, meu site. Naquela época, a internet já começava a substituir o impresso, e vi uma oportunidade mais acessível do que ter minha própria revista. No início, eu não abordava o fato de ser uma pessoa gorda que viaja, mas essa perspectiva passou a fazer parte do meu trabalho depois de vivenciar, junto ao meu marido, também gordo, diversas situações de dificuldades devido ao tamanho dos nossos corpos. Foi então que decidi compartilhar essas experiências no YouTube, e percebi que muitas pessoas se identificaram. Desde então, esse tema passou a estar sempre presente no meu trabalho.”

Planejando a viagem para uma melhor experiência

Para garantir uma boa viagem, o planejamento é fundamental. O primeiro passo é pesquisar sobre o destino e dedicar atenção especial aos detalhes que possam contribuir para uma experiência mais confortável. A escolha do destino deve levar em consideração diversos critérios, como acessibilidade, opções de transporte adequadas, acomodações com móveis e infraestrutura mais espaçosas.

Infelizmente, não temos quase nada voltado para esse assunto especificamente no Brasil e no mundo. Por exemplo, fotos de quartos de hotel nos sites oficiais não são feitas com pessoas na maioria das vezes, então ficamos sem referência do tamanho do box, por exemplo, que é um ponto crítico para gordos nas hospedagens.  Nesse cenário, acho que dentro de cada destino temos que procurar as opções de hospedagem mais confortáveis e isso, na maioria das vezes, quer dizer gastar mais”, observa Sylvia. 

Com a escassez de informações voltadas para as necessidades específicas de pessoas gordas, Pollyane destaca que a melhor abordagem é sempre perguntar. “Observar como são as ruas, o transporte e as instalações da hospedagem é fundamental para garantir uma experiência mais agradável e tranquila. E acredito que devemos ter coragem de questionar. Pergunte sobre tudo: camas, rampas, acessos, toalhas, tudo… O dinheiro é suado demais para nos ajustarmos a espaços onde não nos cabemos. E isso vale também para restaurantes e atrações turísticas. Sempre sugiro que deixemos avaliações dos locais que abordem acessibilidade. Facilita para outras pessoas.”

Polly em viagem na Albânia

 

Essa postura de questionamento não só assegura que a viagem seja confortável, mas também reforça a importância de buscar um serviço que realmente atenda às necessidades de todos os corpos, sem comprometer o bem-estar e a dignidade.

A falta de conforto

Muitos meios de transporte, como aviões, ônibus e trens, não são adequados para acomodar confortavelmente pessoas com corpos maiores. Nos aviões, por exemplo, o tamanho das poltronas e a largura dos cintos de segurança frequentemente não são suficientes para garantir o conforto e a segurança. Em voos longos, a falta de espaço também pode dificultar o descanso.

Na experiência de Polly, o ônibus leito é considerado a “8ª maravilha do mundo”. “Se você pode pagá-lo, é uma excelente opção. Alguns ônibus oferecem leitos individuais, com cortinas e braços móveis, o que é, de longe, o mais confortável. Porém, o assento plus só traz benefícios se você for uma pessoa alta, pois a principal mudança está na distância do assento da frente, e não na largura do assento em si.”

Em relação ao avião, ela compartilha algumas estratégias que utiliza para garantir mais bem-estar: “Geralmente, escolho o assento no corredor, pois me permite levantar o braço da poltrona com mais facilidade. Quando possível, pago um pouco mais para garantir um assento em fileiras onde o assento do meio é bloqueado, embora essa opção tenha custo adicional. E, por último, apelo para a compreensão dos comissários de bordo, pedindo para me transferir para uma fileira mais espaçosa, caso haja lugares disponíveis e a cabine não esteja cheia.”

Sylvia, por sua vez, comenta que as opções de assento conforto em aviões, de modo geral, não são tão eficazes. “Esses assentos oferecem apenas mais espaço entre as fileiras, o que ajuda em termos de espaço para as pernas e melhora a questão da altura, mas a largura dos assentos permanece a mesma dos demais. Ou seja, ainda se tem o desconforto do quadril largo apertado.”

A dica que ela dá é buscar alternativas premium. “Em muitas companhias aéreas, especialmente para voos internacionais ou de longa duração dentro de um país, existe a opção de econômica premium. Essa, de fato, é mais adequada para corpos maiores. Além de oferecer mais espaço entre as fileiras, os assentos também são mais largos, e o serviço é diferenciado. Algumas companhias que experimentei e gostei muito dessa opção foram Delta, KLM e Air Canada. Além disso, a Emirates recentemente introduziu essa opção em seus voos no Brasil.”


Sylvia em viagem na Delta Premium Select – a econômica premium da Delta

 

No caso dos ônibus, Sylvia conta que já faz algum tempo que não viaja dessa forma, mas que seu marido tem feito algumas viagens de leito e aprovou a experiência. “Ele disse que a diferença foi total, não só por ser gordo, mas também pela altura. Então, definitivamente vale a pena, porque a diferença de preço não é tão grande e, em uma viagem longa, o conforto é muito superior. Além disso, hoje em dia, há algumas rotas com ônibus inteiros dedicados exclusivamente a leitos.”

Destinos acessíveis 

Uma das coisas que incomoda muitas pessoas com corpos fora do padrão é a sensação de estar sendo observada. “Tanto em destinos internacionais quanto nacionais, percebo que cada vez menos somos olhadas. As pessoas estão mais focadas em seus próprios afazeres ou olhando para os seus telefones. Como turista, nunca me senti desrespeitada por conta do tamanho do meu corpo. Os assentos de transporte público tendem a ser padrões, e bares e restaurantes têm, cada vez mais, cadeiras sem braços, o que facilita o conforto. No entanto, uma coisa que percebi é que, em algumas regiões, o tamanho do box do banheiro varia conforme o tamanho médio da população. Vi isso em Portugal, por exemplo, onde passei alguns apertos (literalmente)”, comenta a criadora do Viaja, Gorda!.

“Como uma viajante que queria fazer compras de roupas, vi também que a Europa tem extremos: em algumas lojas o GG é o 40; e em outras os 48 vestiria tranquilamente um 56. Então varia muito… talvez na Itália eu tenha sentido as coisas um tanto menores. Já em países como Egito e Marrocos, pelo fato de as mulheres, em sua maioria, usarem roupas largas, era fácil encontrar até tamanhos muito maiores que os meus. E as cadeiras mais confortáveis, camas maiores… mais amplo”, aponta a mineira.

Sylvia destaca que, ao escolher um destino, é útil pesquisar sobre o perfil da população local, pois isso pode afetar o conforto para pessoas gordas. Ela menciona que, em países como a França, onde a população tende a ser mais magra e baixa, os espaços costumam ser menores, como cadeiras estreitas. Já nos Estados Unidos, onde as pessoas são, em geral, maiores, os locais tendem a ser mais confortáveis e acessíveis, com uma maior preocupação com as necessidades do público, incluindo testes de assento em parques temáticos, evitando filas e constrangimentos.

Ela também compartilha uma experiência positiva em um spa termal no Canadá: “Um lugar onde me senti muito acolhida foi em um spa termal numa pequena cidade de montanha no Canadá. Meu marido, principalmente, quase nunca consegue encontrar um roupão que sirva nele. Neste lugar, ao fazermos o check-in, nos entregaram os roupões sem nem precisar perguntar o tamanho. Nos deram os roupões corretos para o nosso corpo. Ou seja, além de oferecer roupões inclusivos, o treinamento da recepcionista foi impecável.”

 

Sylvia no hotel Pullman SP Ibirapuera

O impacto da gordofobia

Sabemos que pessoas com corpos fora do padrão considerado ideal pela sociedade frequentemente enfrentam atitudes de exclusão, desrespeito e violência, o que chamamos de gordofobia. Infelizmente, em viagens, essas situações não são raras e podem causar não apenas sofrimento emocional, mas também psicológico. As viajantes e criadoras de conteúdo relatam já terem vivido experiências violentas, principalmente em serviços de transporte e hospedagem.

“Já fui vítima da gordofobia estrutural, aquela que não leva em conta corpos maiores ao projetar espaços. Uma vez, em Portugal, durante uma das minhas primeiras viagens internacionais, cheguei à hospedagem fora do horário de check-in, deixei as malas e saí. Ao voltar à noite, cansada da viagem e do dia inteiro, fui tomar banho, mas percebi que não passava na abertura do box. Me recusei a não tomar banho, então forcei a entrada, me machucando no processo, ralei a pele tentando passar para dentro e depois para sair. No dia seguinte, tive uma discussão com a recepção e pedi para me darem acesso a um banheiro que fosse adequado ao meu corpo. Foi uma situação extremamente constrangedora, mas conseguimos resolver”, comenta Polly.

“Tive duas situações bem desconfortáveis recentemente. Em nenhuma delas houve ofensas diretas, mas sim questões relacionadas à infraestrutura. No Peru, durante uma excursão com parada para almoço em um local mais isolado, o restaurante era enorme, mas todas as cadeiras eram iguais. Eu não cabia nelas, eram muito desconfortáveis e fiquei presa. Foi uma situação bem frustrante. O outro momento ocorreu em um parque temático nos EUA. Eu experimentei o assento antes de entrar, estava tudo certo. Depois de pegar a fila, me sentei, mas a trava de segurança não se fechou. Nesse caso, acho que o funcionário do parque não teve a paciência nem o treinamento adequado para lidar com a situação da melhor maneira. Resultado: não consegui ir à atração”, lamenta Sylvia.

Essas experiências revelam como, muitas vezes, a falta de adaptação de espaços e a ausência de treinamento adequado para os funcionários podem impactar negativamente a experiência do turista, causando frustração e até impedindo o acesso a atrações e serviços.

Viagem com estilo 

Com o limite de 10 kg para a bagagem de mão em voos, a escolha dos looks pode se tornar um verdadeiro desafio, especialmente considerando que o volume das roupas tende a ocupar mais espaço. Polly e Sylvia compartilharam dicas valiosas sobre como lidar com essa situação.

Sylvia sugere usar sacos a vácuo para economizar espaço. “Dado o volume que as roupas de pessoas com corpos maiores ocupam, é uma boa ideia investir em sacos a vácuo, que ajudam a reduzir o espaço ocupado pela roupa. Quanto ao peso, se a viagem for longa, minha dica é se preparar para lavar roupas. Você pode optar pelo serviço de lavanderia do hotel, que costuma estar disponível na maioria dos lugares, embora essa seja a opção mais cara. Uma alternativa mais econômica é procurar lavanderias self-service em alguns países, onde você mesma pode lavar suas roupas. E, se estiver pensando em ficar em casas ou apartamentos de aluguel, escolher um local com máquina de lavar e secadora pode ser uma ótima solução.”

Polly compartilha que, na hora de escolher os looks, foca na praticidade. “Nas últimas duas viagens longas, que incluíam destinos com clima frio e quente, optei por levar apenas roupas pretas. Elas combinavam facilmente entre si, me sentia arrumada e foi tudo ótimo. Mas sei que nem todas as mulheres se sentem confortáveis com esse desapego de cores. Então, acredito que o importante é entender bem o que você gosta de usar, evitar roupas muito volumosas e lembrar que as peças podem ser repetidas. Além disso, aprender a dobrar as roupas de forma eficiente ou usar sacos a vácuo pode ajudar bastante a otimizar o espaço na bagagem.”

Polly recomenda looks práticos na hora de viajar

Na hora de montar a mala, tanto Polly quanto Sylvia são categóricas: um bom tênis não pode faltar. “O que eu considero essencial, não só para pessoas gordas, mas para todos, é levar calçados confortáveis. Se for uma viagem com muito caminhar, não tem como abrir mão disso. Se necessário, leve também palmilhas para garantir mais conforto. Outra coisa que me preocupo é com bolhas. Então, sempre levo um tipo de curativo que não só protege a bolha, mas também contém um medicamento que ajuda na recuperação da pele. Problemas nos pés e pernas podem arruinar qualquer viagem”, recomenda Sylvia.

“Além de um bom tênis, um bom antiatrito é indispensável para o bem-estar. Não dá para caminhar muito com um calçado qualquer e arruinar a viagem no primeiro dia porque o pé está machucado. O antiatrito também é essencial para evitar assaduras, que podem prejudicar o passeio”, pontua Polly.

Um guia para te ajudar

Apesar dos desafios que pessoas gordas enfrentam ao viajar, é fundamental destacar que todos os corpos merecem, e devem ter, seus momentos de lazer e a oportunidade de desbravar o mundo.  Viajar é uma vivência que promove a liberdade, o aprendizado e o prazer, e todos têm o direito de experimentar esses momentos sem barreiras, veja dicas de como torna esse momento mais agradável sendo uma pessoa gorda:

  • Busque conhecimento: saber o que é gordofobia é o primeiro passo para poder confrontar qualquer tipo de violência que possa acontecer durante a viagem. Entenda que você tem direito de ocupar os espaços e ninguém pode negar isso!
  • Não tenha medo de denunciar: você merece atendimento digno e que seus direitos sejam respeitados. Em qualquer ação contrária a isso, notifique os canais de Ouvidoria e até mesmo a Defensoria Pública.
  • Pesquise sobre o destino que pretende visitar: dedique atenção especial aos detalhes que possam contribuir para uma experiência mais confortável durante sua viagem. A escolha do destino deve levar em consideração diversos critérios, como acessibilidade, opções de transporte adequadas, acomodações com móveis e infraestrutura mais espaçosas.
  • Sempre pergunte: com a escassez de informações voltadas para as necessidades específicas de pessoas gordas, é sempre importante perguntar sobre tudo: camas, rampas, acessos, toalhas, tudo!
  • Ajude outras viajantes: sempre que possível, deixe avaliações sobre suas experiências nos locais no TripAdvisor e no Google. Isso ajuda bastante para que outras viajantes possam conhecer as práticas de restaurantes, hotéis e outros serviços.
  • Não esqueça desses aliados indispensáveis: um bom tênis não pode faltar e um bom creme antiatrito devem estar na mala.
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